Mar.

abril 12, 2005

radiograma

Alegre triste meigo feroz bêbedo
lúcido
no meio do mar


Claro obscuro novo velhíssimo obsceno
puro
no meio do mar

Nado-morto às quatro morto a nado às cinco
encontrado perdido
no meio do mar
no meio do mar


Mário Cesariny

abril 10, 2005

Projecto Mar – Possíveis faróis

Enquanto o Hugo torcia a face como plasticina projectando ritmos, odores e desejos (tudo só com uma guitarra), acompanhei-o com o teclado do computador (sem pensar muito, a desejar muito) e saiu-me isto-em-poucos-minutos:

I

Se a esperança é o vazio,
Sou um gato fundo, sem rabo.
E o amor que golas tem no escuro?
Caminho até encher, até rebentar de tudo tão intenso,
De tudo tão duro, de tudo tão duro por tão tudo, imenso.

Se já nem os espelhos esperam,
Sou a minha própria sombra, eu dilacerado pela luz.
Como quero e sei ser.

Como luz-luz de luto.

E a esperança – é o holofote - num luzirão de camélias.


II

Lembro.
Como recordo as fotos que rasgaste.

Fazia malabarismos. Silêncios, Medos e Vontade de voar
Janela fora. Três bolas coloridas de trás para a frente,
Em cima, no chão.

Mas foi tudo lento-gota a lento-gota,
Porque as guelas soltaram ar, livraram sal, exalataram griiiiiiiiiiiiiiiiiiiitttttttos.
Quanto pesa tanto sul?
Porque perdes tantos sim’s.?

Lembro.E tudo descarrilou borda dos sonhos fora. No Bordel dos sonhos hora.


III

Repare-se na sibilante do golfinho quando expressa
Corporalmente a expressão “impulso, salto, mar-afora, queda, mar-adentro”.
Como o seu movimento é ponto final com toda a beleza.

O agitar circular das águas cria um alvo de desejo
círculos dentro dos círculos
o agitar circular convida mergulhos impossíveis.
E eu gostava que gostasses assim: tudo em mim.


IV

No rótulo escreveu-se:

Jardim com flores e janelas.
Janelas com flores e vista para o Mar.
Mar com flores e peixes a brincar.
Brincadeiras com flores e amizade dentro delas.

Do rótulo li.Bebi.

abril 06, 2005

"o mar será a tua cura. A terra está carregada das leis, mandos e desmandos. O mar não tem governador.
(...)
Cuidado, meu filho, só mora no mar quem é mar."

Mia Couto

abril 05, 2005

há-de flutuar uma cidade no crepúsculo da vida
pensava eu... como seriam felizes as mulheres
à beira-mar debruçadas para a luz caiada
remendando o pano das velas espiando o mar
e a longitude do amor embarcado

por vezes
uma gaivota pousava nas águas
outras era o sol que cegava
e um dardo de sangue alastrava pelo linho da noite
os dias lentíssimos... sem ninguém

e nunca me disseram o nome daquele oceano
esperei sentada à porta... dantes escrevia cartas
punha-me a olhar a risca de mar ao fundo da rua
assim envelheci... acreditando que algum homem ao passar
se espantasse com a minha solidão

(anos mais tarde, recordo agora, cresceu-me uma pérola no
coração. mas estou só, muito só, não tenho a quem a deixar.)

um dia houve
que nunca mais avistei cidades crepusculares
e os barcos deixaram de fazer escala à minha porta
inclino-me de novo para o pano deste século
recomeço a bordar ou a dormir
tanto faz
sempre tive dúvidas de que alguma vez me visite a felicidade


Al Berto
O Medo; Salsugem, 9; 1982

abril 04, 2005

"Há três espécies de homens:
os vivos, os mortos e os que andam no mar."

Platão